Bota suja é sinônimo de felicidade

Você tem permitido que a vida te deixe marcas ou anda tentando passar limpo por onde mais deveria se jogar inteiro?

Essa pergunta pode parecer simples à primeira vista, mas carrega uma provocação profunda. Porque na vida — como na montanha — quem passa ileso demais talvez nem tenha vivido o suficiente. Em um mundo onde tudo é higienizado, editado e filtrado, aceitar a lama no caminho pode ser um ato de presença, coragem e entrega.

As marcas que valem a pena

Tem dias em que a gente volta da trilha exausto, com os pés pesados de lama e a blusa marcada por suor e terra. À primeira vista, isso poderia ser sinal de que algo deu errado. Mas, ao contrário: a sujeira é prova de que estivemos ali, de corpo inteiro, vivendo cada passo do caminho.

Cada mancha é um registro — o momento em que escorregamos e rimos depois, o esforço de ajudar um amigo a vencer um trecho difícil, o apoio silencioso de quem segurou firme sua mão. A blusa suja, o tênis desgastado e o corpo cansado contam uma história: a de quem foi, tentou, sentiu medo, mas seguiu mesmo assim.

Essa entrega é uma constante nas trilhas e, curiosamente, também nas fases mais desafiadoras da vida. Quem enfrenta um término, uma perda ou uma mudança repentina sabe: há um tipo de dor que marca fundo — mas é ela quem também abre novos caminhos.

Quando a dificuldade une

Em um trecho íngreme da trilha, é comum vermos um ajudando o outro. Um empurra pelas costas, o outro estende a mão. Ali, ninguém pergunta se o outro é forte o suficiente: a gente apenas ajuda. A dificuldade vira ponte. Na vida, isso também acontece — ou ao menos deveria. Nos momentos de maior vulnerabilidade, percebemos quem caminha ao nosso lado, quem está disposto a nos acompanhar mesmo com o chão escorregadio e o céu nublado.

Essa união que nasce no esforço coletivo é um dos maiores presentes da montanha. Na trilha, somos todos um. Não há espaço para vaidade quando estamos cobertos de barro e ofegantes. Há, sim, espaço para empatia, partilha e presença real.

A felicidade mora na entrega

Existe uma felicidade peculiar que só sente quem se permite atravessar a dificuldade com o coração aberto. Ela não grita, não brilha como um troféu reluzente, mas se instala no peito feito fogueira acesa depois da chuva. É aquela alegria que vem ao sentar na beira da trilha, olhar para trás e perceber: "Eu consegui." Mesmo sujo, mesmo cansado, mesmo temendo em vários momentos — você conseguiu.

E é aqui que a montanha dá sua lição mais poderosa: quem volta limpo demais talvez não tenha ido longe o suficiente. Evitar os trechos difíceis, manter o tênis intacto e o corpo confortável pode até parecer prudente, mas também pode esconder o medo de se entregar de verdade.

A vida, como a trilha, não recompensa quem tenta passar ileso, mas quem aceita se transformar. As botas sujas, as roupas manchadas e até os arranhões nos ensinam que não existe conquista sem envolvimento real. A felicidade não está no quanto a roupa ficou impecável, mas no quanto a alma se sujou de vida.

Deixe a montanha te marcar

As marcas que a montanha deixa na gente — no corpo, nas roupas, na memória — não são cicatrizes de dor, mas lembranças de que estivemos vivos. São como fotos que ninguém tirou, mas que ficaram gravadas dentro. E, por vezes, é preciso mesmo carregar um pouco de barro para lembrar o quanto valeu a pena caminhar.

Se você também sente que a montanha te transforma a cada passo, talvez goste de explorar outros temas na seção Ser da Montanha, onde reunimos reflexões, relatos e aprendizados de quem caminha com o coração aberto e os pés sujos de vida.

Você tem permitido que a vida te deixe marcas ou anda tentando passar limpo por onde mais deveria se jogar inteiro?

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